Passar para o conteúdo principal
Expos Conceição Abreu

Artista Conceição Abreu, inaugura exposição em Matosinhos, com o apoio do MUHNAC

Inaugurou, ontem 11 de maio, na Galeria da Biblioteca Municipal Florbela Espanca, em Matosinhos, a exposição “entre as linhas de pescar e de tecer” da artista Conceição Abreu que expos no Museu em 2023. A exposição conta com curadoria da museóloga do Museu, Sofia Marçal.

A exposição apresentada em pleno período das Festas do Senhor de Matosinhos, é também uma celebração de identidade, uma valorização das gentes e cultura de Matosinhos, a ser vivenciada e explorada Entres as Linhas de Pescar e de Tecer. Pode ser visitada até 13 de julho de 2024.

***

Texto Curadora

Entre a impermanência do lugar e a permanência de viajar, o gesto do fazer

A exposição Entre as linhas de pescar e de tecer de Conceição Abreu, que se realiza na Biblioteca Municipal Florbela Espanca em Matosinhos foi idealizada com o propósito de criar, numa perspetiva contemporânea, um diálogo com a história da pesca em Matosinhos.  A artista apresenta uma seleção de trabalhos de diferentes tipologias, com variadas técnicas; desenhos, esculturas, instalações e fotografias que vão ao encontro da temática da cidade, onde as linhas de pescar e de tecer se encontram. 

O compromisso da artista com o seu trabalho leva-a a procurar os limites dos materiais e das matérias, concretizando-os em obras de arte e conferindo-lhes a imortalidade.  “Nada como a obra de arte demonstra com tamanha clareza e pureza a simples durabilidade deste mundo de coisas; nada revela de forma tão espetacular que este mundo feito de coisas é o lar não-mortal de seres mortais.”[1] Na exposição expande-se a ideia de perpetuidade à conceção de redes de pesca pelos pescadores.

A cidade de Matosinhos ligada às práticas da pesca e por consequência ao mar, à ideia de partir e de voltar, e inclusive a similitude dos seus gestos e do fazer dos pescadores, inspiraram Conceição Abreu a idealizar esta exposição. Uma mostra que foi concebida dentro daqueles elementos ou tópicos, e que foi desenhada tendo como ponto de partida uma obra sua Destempo de 2015, uma peça tecida com fio de nylon (normalmente usado como fio de pesca) e linha de algodão (próprio dos trabalhos manuais efetuados em crochet, como podem ser exemplo as colchas brancas que noutros tempos cobriam as camas), na qual ecoa o ditado popular “onde há redes, há rendas”.

Citando Conceição Abreu, “ligada às povoações do litoral com atividade piscatória, emergem as noções de viagem e de lugar, que aqui se desenvolvem na sua ligação e entretecimento, tendo como imagem as linhas que as unem e entrelaçam”. As obras expostas resultam, pois, desses cruzamentos com os quais se formaram tecituras e malhas. Prática performativa com a qual a artista ensaia a gestualidade da fabricação das redes e do tecer, e que organiza em movimentos concretos, mas também mentais, transformando, como a própria artista diz, “o lugar (da prática, do fazer) em viagem e dando a essa viagem um sentido de lugar.”

Deambulações (entre viagem e lugar) que na literatura também encontramos, como pode ser exemplo Marguerite Duras, onde a inconstância, esse desejo de viajar e de permanecer, se revela na sua escrita, nos seus livros, “este livro, que eu queria que fosse uma autoestrada em questão, que devia ir a toda a parte ao mesmo tempo, vai ficar a ser um livro que quer ir a toda a parte e só vai a um lugar de cada vez, e que torna a voltar e a partir novamente como toda a gente, como todos os livros, a menos que se calem, mas isso, isso não se escreve.”[2] Numa mesma ideia em que esta exposição pretende ser, simultaneamente, viagem e permanência visual e estética.

A Exposição Entre as linhas de pescar e de tecer reflete ainda o percurso que Conceição Abreu tem vindo a fazer, na sua incessante procura da simplicidade do gesto, na pureza dos materiais utilizados na construção dos seus trabalhos e na subtileza e clareza do seu traço, do seu desenho. Como resultado esta exposição é quase uma exposição retrospetiva onde a leveza das obras expostas se enquadra numa narrativa poética expandida no tempo.

Sofia Marçal

 

[1] Hannah Arendt, in: A condição Humana, p. 181.

[2] Margarite Duras, in: A vida material, p.14.